Bloco dos Mascarados – História

Há décadas, bois e máscaras fazem parte do carnaval da Barra do Jucu

O boi, na história da humanidade, tem uma grande importância cultural em várias regiões do mundo, acompanham homens e mulheres como fonte de sustento e força motriz. Na Índia e em algumas regiões da África são animais sagrados, na Península Ibérica são símbolos de virilidade e força. Os portugueses trazem os primeiros bois para o Brasil na expedição de 1532, de Martin Afonso de Souza. A partir daí, a criação se espalha por todo o Brasil e passa a influenciar várias manifestações folclóricas (Bumba Meu Boi, Boi Pintadinho, Festival de Parintins, entre outros), chegando também ao carnaval da Barra do Jucu.

A vaquinha do Bloco, redecorada anualmente.
Foto: autor desconhecido.

 

As máscaras também acompanham a humanidade desde tempos remotos. Primeiro como símbolo ritualístico, de comunhão com o transcendental, onde encontra forte representação na África. Os gregos, através do teatro, utilizam como disfarce psicológico. Essa forma de utilização das máscaras chega aos carnavais europeus. Os portugueses vão trazer ao Brasil a tradição do entrudo carnavalesco que se utiliza de máscaras para participar das festas.

Máscaras confeccionadas pela comunidade para o Bloco dos Mascarados, da Vaquinha e da Mulinha.
Foto: autor desconhecido.

 

Com a presença dos escravos negros, as máscaras portuguesas incorporam forte influência Africana no Brasil, nos traços e no misticismo que as envolve. Também podemos notar a importante contribuição indígena no acabamento e decoração com tintas, vegetação e ossadas de animais, transformando-se em totem religioso. Essa mesclagem cultural vai compor a tradição folclórica de diversos pontos do país. Essas máscaras passaram a ser utilizadas em várias manifestações folclóricas do Brasil, como a Folia de Reis, o Reis de Bois, Congo de Roda D´água, Jaraguá, e com o tempo chegaram ao carnaval da Barra do Jucu.

Entrevistas realizadas com moradores antigos, por diversos pesquisadores do assunto, relatam que a brincadeira de mascarados no carnaval da Barra do Jucu remonta ao início do século XX. Diziam: “que período de carnaval aqui não tinha nada pra fazer, então eles brincavam de mascarados durante o carnaval”. Confeccionavam as máscaras com tiras de papel, cola de farinha de mandioca ou trigo sobre uma forma totêmica de barro, com pintura feita de tintas produzidas por eles mesmos a partir da vegetação local. Arrumavam qualquer roupa que os cobrisse o corpo inteiro, vestiam essas máscaras e saíam pelas ruas brincando, divertindo os adultos e assustando as crianças. No início eram poucos, cerca de uma dezena, número que aumentou conforme a comunidade cresceu.

Máscara com ossos de animais. Bloco dos Mascarados, da Vaquinha e da Mulinha.
Foto: Flávia Bernardes.

 

A primeira sátira do carnaval da Barra do Jucu teve início entre os brincantes de mascarados e foi protagonizada por Paulo Nunes, que confeccionou uma “cabeça” feita de papel para desfilar. Era uma fantasia do bandido Pedro Grosso, que reza a lenda, roubava e distribuía entre os pobres.

Naqueles tempos, as mulheres costumavam desfilar com máscaras feitas a partir de fronhas de travesseiros. Elas recortavam os furos na altura dos olhos e boca e amarravam prendedores de cabelo nas pontas da fronha acima da cabeça, formando uma espécie de orelha. Depois, algumas recebiam pintura. Essa também era uma forma de identificar mulheres mascaradas, mas também, nada impedia os homens de fazerem máscaras dessa forma e mulheres de fazerem máscaras de papel como as já descritas. Funcionava inclusive como forma de disfarçar-se ainda mais e incrementar a brincadeira. Para citar algumas participantes que nos relataram estas histórias: Ester Vieira e Lígia Maria.

Essas formações de mascaradas nunca foram proibidas no meio dos homens que saíam junto com a vaquinha, mas elas preferiam fazer o grupo delas e sair de locais dentro da própria Barra. Nas ruas elas se misturavam aos foliões e durante o desfile da Vaquinha ficavam próximas, ora se misturavam aos outros mascarados, ora não. A partir da década de 80, o número de mulheres mascaradas foi gradualmente diminuindo. Nos desfiles recentes podemos observar uma ou outra, que encontra o bloco dos mascarados já nas ruas. Por mais que as barrenses não participem, elas gostam e preferem em sua maior parte, prestigiar os mascarados na rua.

Década de 80. Bloco dos Mascarados.
Foto: autor desconhecido.

 

Fica difícil precisar com exatidão quando surgiram as alegorias da vaquinha e da mulinha no Bloco dos Mascarados do carnaval da Barra, entre as várias hipóteses desse surgimento, podemos citar: Máximo Araújo conta que em meados do século XX, ele e outros pescadores barrenses barquejaram o Rio Jucu para vender pescado em Vitória e lá presenciaram uma “brincadeira de boi” no carnaval da capital. Resolveram fazer a tal alegoria do boi no carnaval da Barra, que ganhou o nome de “vaquinha” e desfilou junto com esses mascarados pelas ruas da comunidade de surpresa, simulando uma “vaca brava”, correndo junto com os mascarados e avançando em cima dos foliões. O sucesso da brincadeira entre os barrenses foi tanto que nunca mais parou até os dias atuais. O primeiro que saiu no bojo dessa alegoria foi Haroldo Vieira.

A vaquinha avança sobre os foliões.
Foto: autor desconhecido.

 

Outra nova adaptação veio de Oscar Valadares, que confeccionou a alegoria de uma mula, vestida no corpo, na altura da cintura, chamada de “mulinha”. Essa mulinha representa o vaqueiro, que controla a vaca. Vacas soltas correndo pelas ruas e vaqueiros eram muito comuns na Barra do Jucu daqueles tempos, vez ou outra fugiam vacas de fazendas locais que vinham parar nas ruas. A comunidade era uma típica vila de pescadores com aspectos rurais.

Moradores locais relatam do pessoal das comunidades ribeirinhas (Itapuera, Jaguaruçu, Caçaroca, Araçatiba…) descerem o rio para passar o verão na Barra e curtir o carnaval, trazendo essas novidades para o balneário. Outros moradores dizem que as alegorias da vaquinha e da mulinha vieram das fazendas do entorno da Barra, inspiradas na presença das vacas nos pastos. Em Galvêas (2005, p. 160) lemos: “Incorporando a vaquinha pelo que constatei nas entrevistas, primeiro saiu Seu Dionísio de Itapuera; depois Seu Haroldo Vieira, por mais de 30 anos”.

A mulinha do bloco. Foto: autor desconhecido.

 

Com o passar dos anos a comunidade cresceu, as crianças que não podiam brincar com os adultos organizaram suas turmas de mascarados, que por sua vez, vetavam crianças menores que organizavam novas turmas. Nesse período, a turma mais famosa, além da turma da vaquinha, era a de Wllisses Vieira, que circulou entre os anos 80.

A partir dos anos 80, chegaram as máscaras industriais, feitas de borracha, de monstros e bichos assustadores, inspirados na literatura e filmes de terror estrangeiros, fabricadas em outros estados, facilmente encontradas nas lojas. Os brincantes passaram a vestir essas máscaras e com o tempo boa parte da comunidade esqueceu-se do rito de confeccionar sua própria máscara.

Hoje o bloco da Vaquinha, Mulinha e Mascarados permanece com algumas dezenas de participantes e a brincadeira segue parecida com o Entrudo do carnaval colonial brasileiro.

Créditos do texto: Marcus Vinícius Machado de Oliveira

Colaboração: Homero Bonadiman Galveas

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